“Brainstorming” golpista, falta de consenso e polidez; a tutela militar segue
Carlos de Almeida Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica, testemunha de acusação no processo contra Jair Bolsonaro e outros 32 por tentativa de golpe de estado, relatou em audiência ocorrida nesta quarta-feira (21) na Primeira Turma do STF ter participado de reuniões de “brainstorming” (tempestade de ideias) em que se cogitou a prisão de Alexandre de Moraes, então presidente do TSE.
A intenção era impedir a posse de Lula. Mesmo não sendo papel dos militares fiscalizar eleições, o relatório encomendado por Bolsonaro não apontou nenhum indício de fraude nas urnas eletrônicas.
A reunião onde se apresentou uma minuta de golpe teve a presença dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, além do então ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira. Dos comandantes, apenas o Almir Garnier (Marinha) foi denunciado pela Procuradoria Geral da República. Garnier colocou as tropas – 14 mil fuzileiros – “à disposição” do golpe e segundo Baptista Júnior (Aeronáutica), ele e Freire Gomes (Exército) tentavam “demover o presidente”.
Faltou consenso… e faltou voz de prisão
O que parece uma queda de braço entre legalistas e golpistas ganha outro contorno com a afirmação do ex-comandante da Aeronáutica: “infelizmente, uma vez falei a ele (Garnier) que nada pode ser tão pior para as Forças Armadas que não ter uma postura de consenso, e, talvez isso tenha sido o mais difícil, o almirante Garnier não estava na mesma postura que Freire Gomes e eu”.
Na segunda-feira (19), também em depoimento, Freire Gomes, negou que tenha dado voz de prisão à Bolsonaro enquanto as alternativas golpistas eram debatidas. O ex-comandante do Exército se limitou a afirmar que se Bolsonaro atuasse fora da legalidade poderia ser “implicado juridicamente”. Ao contrário de dizer claramente que iria impedir, Gomes afirmou que caso fosse adotada uma medida ilegal o Exército “não iria atuar em algo que iria extrapolar a competência constitucional”.
O ex-comandante admitiu que houve uma reunião em dezembro de 2022 para discutir formas de impedir a posse de Lula. Contudo, quando apresentado à minuta golpista disse que o documento “não chamou sua atenção” porque “os considerandos eram embasados em aspectos jurídicos na constituição”.
No depoimento, Gomes foi advertido por Alexandre de Moraes para que não mentisse em juízo. Moraes citou o depoimento dado à Polícia Federal em que disse que Garnier teria se colocado “à disposição” do presidente. A repreensão veio após Gomes afirmar que “o almirante Garnier tomou a postura dele (…) Não interpretei como qualquer tipo de conluio”.
Há uma política de cobertura entre os comandantes. Numa democracia, debater alternativas golpistas entre comandantes militares e a Presidência da República é crime de flagrante delito, e teria que ser respondida com voz de prisão. Nenhum dos ministros negou participar das reuniões ou pode alegar o desconhecimento das intenções de Bolsonaro. Contudo, a cobertura vai além dos depoimentos, afinal somente Garnier foi denunciado pelos juízes do STF tendo os demais chefes militares “apenas” participado de reuniões.
O verdadeiro consenso entre eles é que todos devem se safar, como se safaram os golpistas autoanistiados de 1964. A tutela militar e a impunidade estão nas raízes dos golpistas de 2023. As chapas Virar à Esquerda seguirão cobrando a prisão de Bolsonaro e os generais golpistas.
Marcelo Carlini, suplente do DR PT/RS