Conferência Mundial Aberta contra a Guerra e a Exploração (1)
Reuniram-se na Argélia, entre 8 e 10 de dezembro, 230 delegados de 42 países
Por iniciativa do Acordo Internacional dos Trabalhadores e Povos (AcIT) e organizada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) da Argélia (país do norte da África), realizou-se com sucesso a 9ª Conferência Mundial Aberta (CMA) contra a guerra e a exploração.
O Diálogo e Ação Petista (DAP), agrupamento de militantes do PT que participou ativamente na preparação dessa conferência, sendo aderente do AcIT desde a sua formação, apresenta nessa primeira, de quatro matérias, os seus resultados:
A delegação brasileira
A convocatória para a conferência foi lançada há um ano e recebeu a adesão de cerca de 700 militantes e dirigentes políticos e sindicais de 60 países de todos os continentes, dentre os quais 26 do Brasil (sindicalistas, parlamentares, dirigentes políticos e de movimentos populares).
As delegações foram preparadas com o critério de autofinanciamento e em vários países, como no nosso, campanhas financeiras foram realizadas para cobrir os custos da viagem e para contribuir com o fundo internacional de solidariedade, criado para ajudar delegações com maiores dificuldades para cobrir os seus gastos.
A delegação brasileira foi composta por nove companheiros: Luís Eduardo Greenhalgh, representando o PT; Vicentinho, deputado federal do PT (SP); Misa Boito, da executiva do PT-SP; Markus Sokol, da executiva nacional do PT, André de Sena, militante petista do DAP; Paulo de Farias, dirigente da CUT-RS; Edvaldo Pitanga e Jurandir Liberal, dirigentes da Confederação Democrática dos Servidores Federais (CONDSEF-CUT) e Julio Turra, representando a CUT e também membro da coordenação do AcIT.
Nesta edição especial registramos o desenrolar da conferência, realizada em Zeralda, município da “willaya” (província) de Argel, publicamos sua Declaração final na íntegra e o depoimento de delegados e delegadas de distintos países.
DELEGAÇÕES PRESENTES:
África do Sul (Azânia), Argélia, Alemanha, Benin, Brasil, Burkina Faso, Camarões, Chade, Chile, Costa do Marfim, Congo, Cuba, Espanha, Federação da Rússia, França, Gabão, Guadalupe, Guiné, Ilha Maurício, Iraque, Irã, Líbano, Mali, Martinica, México, Níger, Palestina, Peru, Portugal, República Democrática do Congo, Reunião, Senegal, Sérvia, Suécia, Suíça, Togo, Tunísia, Turquia, Ucrânia e Venezuela.
Delegações de três países não puderam chegar à Argélia: Bélgica (em função de greve no país), Haiti (recusa de visto de trânsito na França) e Marrocos (situação política tensa no país).
Os debates na Conferência
Três dias que mostraram a unidade dos problemas que enfrentamos
A Conferência Mundial Aberta contra a Guerra e a Exploração iniciou-se um dia após o anúncio feito por Donald Trump de transferir a embaixada dos Estados Unidos em Israel de Tel Aviv para Jerusalém.
Na abertura dos trabalhos Luísa Hanoune (PT Argélia) transmitiu aos 230 delegados o conteúdo das declarações que havia dado na coletiva de imprensa que acabara de ocorrer com membros da coordenação do AcIT: “As provocações de Trump contra a Palestina confirmam as contradições evocadas na convocatória desse nosso encontro: todo o sistema imperialista está em decomposição política”.
Provocação que, na própria conferência, foi respondida pela afirmação da determinação do povo palestino de seguir lutando por liberdade, soberania, pela terra e o direito ao retorno, explicitada por delegados palestinos. Uma moção particular repudiando a provocação de Trump e apoiando a luta palestina foi integrada à Declaração final adotada no terceiro dia da conferência (ver página 7).
A política de Trump, para além da Palestina, traduz a crise mundial do imperialismo que o leva a aumentar seus ataques aos trabalhadores e povos, a provocar guerras em benefício de grandes empresas que competem para pilhar as riquezas das nações.
Pilhagem e “guerra ao terrorismo”
Em sua intervenção a secretária geral da União dos Sindicatos Livres de Camarões falou sobre a situação na África: “Na República Democrática do Congo, de 1996 a 2003, as guerras causaram 6 milhões de vítimas. A Monusco (missão da ONU) está lá há 18 anos e nunca se recuperou a paz. O que há por trás dessas guerras? O país detém 60% das reservas mundiais de coltán (nióbio e tântalo), mineral estratégico para novas tecnologias. É a razão porque multinacionais como Nokia, Alcatel, Apple ou Nikon financiam a guerra de Kivu (região do Congo).
São os mesmos trustes, como disseram delegados europeus, que nos países imperialistas provocam “reestruturações”, demissões em massa, pressionando por redução de direitos sociais e trabalhistas. E que, para tanto, querem destruir a independência das organizações sindicais para minar a resistência dos trabalhadores.
Um delegado da Confederação Geral dos Sindicatos Livres de Níger afirmou que em seu país: “Bases francesas e dos EUA enviam drones armados para sobrevoar o território em nome da luta contra o terrorismo. O Níger tem urânio, ouro, petróleo, explorados por empresas estrangeiras isentas de impostos, enquanto a dívida externa asfixia o país e a miséria e falta de futuro empurram jovens a redes como “Boko Haram” (grupo islâmico)”.
O delegado do sindicato de professores da União Geral de Trabalhadores da Tunísia, insiste: “A guerra contra o terrorismo serve para esconder outra guerra: a guerra social. Em minha cidade, Kaserim, caíram 22 mártires da revolução tunisiana que derrubou Ben Ali. Hoje a realidade de Kaserim é a militarização para reprimir os movimentos sociais”.
A “guerra contra o terrorismo”, explicou um sindicalista do Senegal, provoca também o êxodo maciço de jovens “empurrados ao suicídio no deserto ou nas águas do Mediterrâneo, se escapam são capturados como escravos ou perseguidos nos países onde chegam”.
Ofensiva contra os direitos
Nessa ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e dos povos vale tudo. Como explicaram os delegados brasileiros, vale inclusive o golpe de Estado “institucional” que derrubou Dilma para “impor a privatização de tudo, a destruição de direitos trabalhistas e previdenciários”. Um golpe contra a soberania popular e nacional que continua com a perseguição judicial a Lula para impedir sua candidatura à presidência em 2018.
Na Venezuela, explicou Raúl Ordóñez, depois da instalação da Assembleia Constituinte e dos resultados das eleições regionais que reforçaram o governo Maduro, “os EUA impõem um bloqueio financeiro, médico e alimentar para derrubá-lo”.
No centro dessa ofensiva está a tentativa dos governos de disciplinar ou associar a seus planos as organizações sindicais através do chamado “diálogo social”. Um sindicalista da França explicou que: “Os decretos-lei de Macron passaram, e é preciso dizer que graças à margem de manobra que lhe deram as direções do movimento operário sob pretexto de evitar o pior”.
Ao mesmo tempo, em todos os países, no interior de suas organizações, militantes se levantam para defender a independência sindical, como apareceu nas intervenções de companheiros da Argélia, África do Sul, Romênia ou Alemanha, cuja situação, explicada por um delegado do sindicato Ver.di, é de “fracasso eleitoral conjunto da CDU (partido de Merkel) e do SPD (social-democracia) expressa a recusa às políticas desenvolvidas desde 2010, em particular da grande coalizão CDU-SPD. Na Alemanha tudo se concentra no fato que é proibido fazer greve contra decisões estratégicas de uma empresa ou contra decisões de governo. Mas em 2017 impusemos uma greve de todas as empresas aeroportuárias (serviço de terra) e arrancamos uma nova convenção coletiva”.
Todas as intervenções sublinharam a necessidade de preservar ou reconquistar a independência das organizações sindicais e políticas dos trabalhadores, pois “quando se transige com a burguesia, a catástrofe está garantida”, como disse um delegado francês.
Assim, ninguém podia prever a situação na Catalunha, mas é certo que o povo catalão não resolverá o problema por si só. Como explicou um delegado da Espanha “é a classe operária unida em toda a Espanha contra o regime da Monarquia e sua política, o que poderá dar satisfação às reivindicações sociais e democráticas e impor a solução da República”.
Formar um comité internacional de ligação
Nos três dias da conferência se desenvolveu, portanto, um debate entre os delegados sobre a base de sua experiência concreta na luta de classes. Uma mesma convicção reforçou-se na discussão: a necessidade do intercâmbio de pontos de vista, de experiências de luta, poderá, através de um internacionalismo ativo, ajudar a organizar a resistência em cada país, ajudar a classe trabalhadora a abrir uma saída.
Daí a importância da proposta, recebida por todos os delegados com aprovação, de se constituir, neste início de 2018, um comitê de ligação internacional entre representantes de todos os países que se engajaram na preparação e na realização exitosa da 9ª Conferência Mundial Aberta do Acordo Internacional dos Trabalhadores e Povos.