Contribuição do DAP sobre balanço eleitoral 2020
O Comitê Nacional do Diálogo e Ação Petista se reuniu na última sexta (04), realizando uma discussão de balanço eleitoral 2020 a ser remetida ao Diretório Nacional do PT, que se reúne nesta segunda-feira (07). “O balanço deve ser feito. Mas, de imediato, para começarmos a sair desta maré, o partido deve entrar fundo na organização da luta pelas necessidades do povo trabalhador”. Leia abaixo.
Contribuição de balanço eleitoral 2020 ao Diretório Nacional do PT
PARA SAIR DESSA MARÉ
Luiz Eduardo Greenhalgh,
Misa Boito e Markus Sokol,
por mandato do Comitê Nacional do DAP em 04.12.2020
Após as eleições a vida vai ficando a cada dia, literalmente, cada vez mais dura para o povo.
A pandemia recrudesce, os trabalhadores continuam desprotegidos, principalmente pela criminosa ausência da testagem em massa.
Aumenta o desemprego para mais de 14 milhões que soma cerca de 40 milhões de desocupados, e a miséria cresce na escala de milhões ao mês: de agosto a setembro quando começou a diminuir a ajuda para R$ 300, passaram mais 4 milhões para “extrema pobreza” totalizando 9 milhões (dados da FGV). Os alimentos ficam em preços mais proibitivos para a família trabalhadora. E em janeiro, com o fim do dito “Orçamento de guerra”, os auxílios emergenciais vão acabar, enquanto os despejos devem voltar e as dívidas municípios serão cobradas. Os bancos vão querer a cobrança do R$ 1 trilhão à mais do endividamento nacional recorde (12 meses até outubro, dados do BC).
Portanto, deve se agravar uma situação cuja gravidade já se ligava ao crescimento da parte do povo que, não vendo saída, não se interessou nos candidatos do pleito de novembro, e se absteve, votou nulo ou branco – quase 40% do eleitorado!
Estagnação
O PT sai destas eleições municipais de 2020 estagnado no patamar de 2016, praticamente com os mesmos 7 milhões de votos – 100 mil votos à mais -, de quando perdeu 10 milhões de votos no auge da ofensiva contra o partido, após o golpe do impeachment. Portanto, neste ano não se permite um balanço vitorioso. Mas se registra um deslocamento do voto no PT dos “grotões” (aparecido em 2006) para as grandes cidades, ali onde a classe trabalhadora está concentrada e mais organizada.
Porque os porta-vozes da burguesia insistem que o PT é o grande derrotado destas eleições?
A mídia alardeia a debacle do PT e a “grande” vitória de partidos de direita, procurando uma alternativa ao chamuscado Bolsonaro mais a frente, a quem ela finge não ter ajudado a se eleger.
Mas o fato é que houve um aumento da fragmentação partidária entre os prefeitos eleitos pela direita, tomada de conjunto – não emergiu um instrumento de dominação, nem uma liderança mesmo ilusória. A ausência eleitoral é que assombrou o cenário.
A verdade é que a “velha política” se preparou engordando seu caixa nas prefeituras, manipulando desde abril as verbas do “Orçamento de guerra” que o Congresso unânime lhe deu, e pode recorrer ao “uso da máquina” como nunca em vários casos, se valeu da flexibilização da cobrança das dívidas para inaugurar o que podia e não podia, o que explica o “mistério” da taxa de 63% de reeleição. Esses partidos entre aspas são a parte grande da crise de representação.
Mas eis que o PT que quiseram até “varrer”, mesmo se não foi vitorioso, segue ocupando um lugar singular, único de oposição no plano nacional. Isso lhe permite ser um ponto de apoio para o povo no próximo período. A tendência à explosão social – clara na América Latina: Chile, Peru e Guatemala – e a sobrevivência do PT aqui no Brasil, são uma combinação que enerva a burguesia e o imperialismo.
Um “viés de alta”
Recuando nos “grotões”, o PT caiu de 256 para 183 prefeituras conquistadas. Mas manteve, até cresceu um pouco o número de vereadores, de 2808 eleitos em 2016 – quando perdeu 60% do que tinha! – para 2864 eleitos agora no 1º turno em 2020, estancando assim a sangria.
Ainda mais que em 2016 o PT fora ao segundo turno em 7 cidades com mais de 200 mil eleitores, e, agora, em 2020, foi em 15 cidades, conquistando 1 milhão de votos à mais do que em 2016. Isto deve ser levado em conta não para mitigar problemas, mas para destacar o ponto de apoio. Com maior presença nas grandes cidades, o PT se reaproxima dos locais onde a classe trabalhadora se concentra e é mais organizada.
Dessas 15 cidades em que disputou o segundo turno, o PT ganhou em 4: Contagem e Juiz de Fora em Minas Gerais, e Diadema e Mauá no ABC paulista, além do vice em Belém. São cidades de composição trabalhadora, como os outros 9 grandes centros onde o PT fez 40% dos votos no segundo turno, mesmo se não ganhou capitais. É a base para a plena retomada do seu lugar histórico.
Mas estará o Partido preparado?
Se preparar para uma nova fase, depende de alguns fatores, onde se destaca encarar a crise de representação política emergente, expressa numa soma ainda maior do que no primeiro turno do total da Abstenção, votos Brancos e Nulos, neste segundo turno, de 38,4% do eleitorado – foi de 32,8% no segundo turno de 2016. Essa ausência eleitoral foi a “vencendora” (!) em várias cidades, até em capitais importantes como o Rio.
Nem a mídia nem os vencedores oficiais querem tirar uma conclusão deste fenômeno, isto quando ousam comentá-lo!
Mas não é preciso ser revolucionário para ser realista. A direção do PT, em especial, deveria ser realista e encarar esse problema. Não se pode dizer que é o produto do aplicativo do TSE, que facilitou a abstenção. Pois ela aumentou este ano, mas os dados do TSE mostram que caíram os brancos e nulos de quem, na pandemia, não quis ir lá votar branco ou nulo, mesmo se o voto é “obrigatório”.
Este não é um fato novo ou acidental. É mais relevante por ser a continuação da lenta e regular erosão da representação política desde as eleições de 2008 (ainda governo Lula).
Tampouco é um problema brasileiro, mas, sim, a expressão aqui de um fenômeno mundial na crise atual. Os partidos em geral – mais aqui, menos ali -, e em particular partidos tradicionais socialistas ou populares, perdem substancia, até desaparecem – e partidos “alternativos” aparentados (tipo Syriza grego ou Podemos espanhol), mostram fôlego curto. O que se vê cada vez mais, ao lado e junto, são explosões sociais fora daqueles partidos.
A América Latina e o mundo
É para esta situação que o PT deve se preparar, com um pé na “institucionalidade”, outro pé fora, um olho na esquina, e outro olho no horizonte. Afinal, este não é um problema de “aggiornamento” identitário, e é de outro modo, política e programaticamente, que devem ser tratadas as mulheres, os negros – maiorias -, a juventude e os LGBT, além dos indígenas.
O fenômeno mundial é ainda mais claro no último período na America Latina, desde o “estallido social” no Chile em outubro de 2019, cujo conteúdo foi retomado na estrondosa vitória do “sim” pela Constituinte no Plebiscito de outubro, por sua vez seguido da explosão da juventude autoconvocada no Peru pondo na rua o “Fora Todos, Constituinte” em novembro, e, agora, a invasão popular que incendiou o Congresso da Guatemala contra um corte orçamentário brutal “devido” ao endividamento. Tudo isso em plena pandemia. Nenhum destes três cenários vai se repetir no Brasil, é verdade, mas é ainda mais verdade que estamos ligados por uma mesma tendência no continente, em face da mesma opressão imperialista.
E de Trump à Biden, ninguém deve pensar que o imperialismo vai recuar. A crise capitalista com suas consequências para as massas, foi só acelarada pela pandemia, como na uberização anterior da economia. E tanto os “negacionistas” aproveitam para tentar passar a boiada das contra-reformas, de um modo, como os “científicos” à la Dória ou Macron, na França, de outro modo, recorrendo à retirada de direitos e liberdades, o que encontrou a sua resposta semi-espontânea agora nas ruas.
Este é o autêntico espírito internacionalista do filiado número 1 do PT, Mário Pedrosa, que faz parte de nosso legado. O PT deveria retomá-lo, na celebração dos seus 120 anos, agora oportunamente organizada pela Fundação Perseu Abramo.
A verdade é que a crise do sistema de representação em geral, realimenta de forma particular no Brasil, a perspectiva da luta por uma Assembléia Constituinte Soberana – unicameral, proporcional, com voto em lista e financiamento público exclusivo – para abrir uma saída para o povo com as reformas estruturais – reforma política, jurídica, da mídia e, inclusive militar -, como disse o 7º Congresso do PT. Foi o que levantou a plataforma Lula-Haddad no 1º turno presidencial de 2018 (retirado por Haddad no 2º turno).
Não está tudo bem
Isto quer dizer que o resto no PT, está tudo bem. Não! Nestas eleições se aprofundou um dilaceramento do partido. Casos notáveis foram São Paulo e Recife, Fortaleza (no 2º turno) e João Pessoa, com cenas de mandonismo explícito.
A campanha revelou problemas que permanecem em função do balanço não feito, em particular da questão da conciliação nos 13 anos de governo. A linha de campanha eleitoral de defesa do legado para preparar 2022, não convenceu muito, nem os próprios dirigentes de muitas cidades. Mesmo a nacionalização da defesa de Lula na campanha foi relativa, fora do dia do 75º aniversário, quando devia ser um lema partidista.
Na real, a linha do legado não-assumida ajudou a olhar por cima da vida real, das lutas do dia a dia, “municipalizando” neste sentido. Olhando para trás, é inexplicável o PT ter deixado de fora, ou secundarizado na atividade nestes meses – propaganda e agitação –, os conflitos sociais, como o fato da grande greve geral nacional de quase um mês dos Correios em setembro, resistindo de forma emblemática ao desmonte Bolsonaro e da direita (aliás, nem a CUT, nem muito menos, outras centrais e as famosas “frentes” disseram a que vieram no período – um outro tema para aprofundar uma reflexão necessária no balanço; também é claro que votaríamos o impeachment e queremos vacinas, mas não é uma tática eixar nisso para trazer o “centro” – não deu certo!).
Focar tudo no legado guarda uma relação com um exagero evidente, mesmo se os nossos foram os melhores governos, pois, afinal não foram feitas as profundas reformas estruturais que precisavam ser feitas para a conquista da soberania, nacional e popular. Em segundo lugar, a situação do povo já era dramática este ano para “votar esperando nova votação”, dali a dois anos. Pois permanecem intactas as instituições, como o Congresso Nacional que vota dia sim, outro também, ataques ao povo, fazendo retroceder, inclusive, as conquistas durante os governos petistas. Como também o Judiciário, conivente com a farsa de Moro, protela o julgamento sobre a parcialidade do ex-juiz e mantém Lula sem direitos políticos.
Alianças espúrias foram feitas contra a resolução do 7º Congresso, outro problema que confunde o PT com “tudo que está aí”. Parte dos votos dos partidos de direita contou com apoio do PT!
O balanço deve ser feito. Mas, de imediato, para começarmos a sair desta maré, o partido deve entrar fundo na organização da luta pelas necessidades do povo trabalhador. E, afinal, Bolsonaro, mesmo se saiu muito chamuscado das eleições, vai seguir atacando, e para isto conta, além dos generais, com as demais instituições.
São Paulo e as alianças
Uma discussão sobre o balanço deve levar em conta os problemas, como o resultado na capital paulista. Em São Paulo houve uma marcação cerrada da grande imprensa contra nosso candidato, Jilmar Tatto, o que faz parte da “ordem natural das coisas”, mas também problemas internos. Embalados por disputas internas e a busca de miríficas “frentes de esquerda” rebaixando o lugar do PT, setores do partido – como de maneira contundente algumas candidaturas proporcionais – não fizeram a campanha para Jilmar, pressionado por cima para desistir da candidatura.
São fatos que vão esgarçando o PT.
As alianças que violentaram as decisões do 7º Congresso do PT, com a chancela da Comissão Executiva Nacional, levaram a abrir mão de candidatura própria para apoiar candidatos identificados com a base bolsonarista, como o prefeito de Belford Roxo (RJ) ou a atual prefeita do Republicanos em Francisco Morato, na grande São Paulo. Além das dezenas de substituições de petistas por figuras do centrão e da direita, de Jaboatão à Arapiraca e Juazeiro do Norte.
No segundo turno no Rio de Janeiro, depois da vigorosa campanha de Benedita que reanimou o partido, vem o desastroso apoio a Paes do DEM do Maia.
Agora, Frente com quem?
É preciso discutir, e levar em conta também outros elementos.
O PSOL cresceu, mas de 2 para 2,2 milhões de votos no 1º turno, ganhou 5 prefeitos, inclusive, no 2º turno, numa capital, Belém. Sua estrela é Guilherme Boulos, líder do MTST. A mídia quer que pareçam muito maiores do que são, como substitutos pela esquerda do PT, mas nem os votos nem as plataformas eleitorais permitem essa conclusão.
O PSOL, diz seu presidente Juliano Medeiros (OESP 24/11), “está ressignificando a radicalidade” (“rechaçamos o extremismo”). Boulos rechaçou o aumento do IPTU progressivo sobre as mansões, mantido por Jilmar do PT, além da reversão das Organizações Sociais. Quem, como nós, votou Boulos contra Covas (PSDB) no segundo turno, se inquieta com o seu futuro.
O PCdoB regrediu muito este ano, quase um século de stalinismo! Não foi só recuo eleitoral. Sua presidente nacional, Luciana Santos, vice do governador do PSB em Pernambuco, viu a defecção do deputado estadual João Paulo indignado com os “deploráveis ataques ao PT” – o ex-prefeito do Recife mostrou mais moral comunista do que seu novo partido, e do que o governador do Maranhão, Flávio Dino, apoiadores da cúpula oligárquica do PSB. Tanto mais grave quanto o PT foi generoso no apoio a Manuela, com o vice, na disputa em Porto Alegre.
Noutro plano de problemas, o PDT, cuja direção oligárquica baseia-se no Ceará – os Ferreira Gomes, Ciro e Cid – também apoiou João Campos do PSB até o fim. Mas o deputado federal Túlio Gadelha (PE) veio a apoiar Marília (tem razão a candidata do PT, Marília Arraes, após o resultado, de mandar o recado: “Rachamos a muralha do PSB, da próxima vez, a gente derruba”- é o sentimento da militância do PT). Registre-se que o PSB e o PDT tiveram recuo eleitoral.
Torna-se intolerável, sob todos pontos de vista, o comportamento de dirigentes locais que atacaram a candidata, ao invés de defender o partido. Para isso, o PT tem mecanismos estatutários de defesa que foram acionados.
Conclusão
Concluindo, o Diálogo e Ação Petista propõe ao Diretório Nacional reorientar o partido:
- destacar do Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil, tanto para a ação prática nas ruas, nas entidades sindicais e populares, como no parlamento, alguns pontos, tais como Testagem da Covid em massa, 5 milhões de empregos em obras públicas, Tabelamento da cesta básica, extensão do Auxilio de R$ 600 durante a pandemia, Bolsas estudantis, Condições sanitárias para a volta às aulas, Taxação das grandes fortunas com um Fundo Extraordinário de taxação das exportações agrícolas e minerais, Direitos políticos para Lula-Anula STF, um conjunto de Medidas de Emergência que, junto com o combate contra as privatizações e à reforma administrativa, alavanquem a luta pelo Fim do Governo Bolsonaro; aqui, Projetos de Lei de Iniciativa Popular, como pela Testagem, podem ajudar a falarmos para todos;
- reafirmar a política de alianças nacional do 7º Congresso “democrática e anti-imperialista” com o PSOL, o PCdoB e setores populares do PSB e PDT, não com as oligarquias como os Campos e os Ferreira Gomes. Esta discussão foi reaberta pelos fatos, que são teimosos e questionam a linha tortuosa confusionista da Executiva Nacional de fevereiro, onde cabe quase-tudo. A primeira conseqüência é este DN sinalizar claramente por uma candidatura da Oposição – de corte democrático e antiimperialista – para as presidências da Camara e do Senado, nem Maia nem Lira, ou Alcolumbre!
- retomar o debate da perspectiva de uma Assembléia Constituinte Soberana, nos termos do 7º Congresso e do Plano de Reconstrução, mas desde já, não apenas em 2022, com a luta por um novo governo, e Lula Livre;
- orientar a realização de Plenárias da militância, virtuais ou presenciais, conforme a decisão dos DMs, acompanhadas pelos membros dos DRs e DN, para debate o Balanço das Eleições e a situação do país.
- discutir a reorganização do PT, acentuando o investimento na estrutura com o incremento de cargos cedidos pelos parlamentares; é chora de retomar as finanças em dia de todos, reforçar a Casa 13 e avançar numa ousada política de Comunicação própria do PT, que é mais necessária do que nunca.