Lula é um alvo prioritário da ação criminosa das milícias digitais
Por Milton Alves*
“É preciso estar atento e forte/Não temos tempo de temer a morte/Atenção para as janelas no alto/Atenção ao pisar o asfalto, o mangue/Atenção para o sangue sobre o chão/Atenção…”, abro o texto com o refrão da bela canção Divino Maravilhoso de Caetano Veloso para discorrer sobre a criminosa fake news divulgada pela jornalista Leda Nagle de um suposto “plano” de Lula-STF para matar o presidente Jair Bolsonaro. O crime praticado pela jornalista foi um dos assuntos mais comentados durante a semana, com uma vasta repercussão na imprensa e nas mídias sociais.
A jornalista divulgou uma fake news postada no perfil do Twitter atribuído ao diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Gustavo Maiurino. A Polícia Federal já denunciou a conta como falsa. Leda Nagle diz que repassou a informação em uma live de um grupo, no qual ela comenta as notícias políticas, e não houve tempo para conferir se a postagem era verdadeira ou não. Leda pediu desculpas na segunda-feira (19).
O episódio é revelador da verdadeira guerra suja em curso movida pelas milícias digitais da extrema direita bolsonarista. O ex-presidente Lula, com a recuperação de seus direitos políticos, passou a ser um alvo prioritário dos milicianos digitais. O que aponta para uma permanente guerra subterrânea e sem quartel estruturada pelo gabinete do ódio e de seus tentáculos nas redes sociais – principalmente tendo em vista o futuro embate eleitoral de 2022.
O padrão e a técnica de difusão das fake news parece seguir o mesmo roteiro de 2018: A milícia digital planta em alguma rede social a “notícia” através de um perfil falso ou em um sítio criado para esse fim e centenas de bots entram em ação para espalhar a mensagem.
O WhatsApp é o aplicativo mais utilizado para ação dos milicianos digitais. Diferente do Facebook, Instagram e Youtube, que são de interação pública, o WhatsApp é uma ferramenta de comunicação interpessoal, formada por redes de interesses profissionais, familiares, religiosos, grupos de vizinhos, torcedores de clubes, grupos de amigos, de afinidades políticas e culturais, entre outros. Ou seja, apresenta uma capilaridade e é utilizado com maior frequência no contato cotidiano, substituindo na maioria das vezes o telefone.
Foi assim que se espalhou rapidamente a célebre fake news da “mamadeira de piroca”, uma invenção digital, entre outras, da campanha nas redes sociais do então candidato à presidência da República Jair Bolsonaro. A imagem circulou intensamente nas redes sociais [principalmente no WhatsApp] durante o segundo turno das eleições presidenciais de 2018, informando que, caso eleito, o então candidato Fernando Haddad (PT), faria a distribuição em massa pelas creches do país de mamadeiras em formato de pênis. O impacto da mentira foi muito forte entre as camadas populares vinculadas aos setores religiosos neopentecostais, reforçando um estigma contra Haddad, que não teve condições de rebater o violento desgaste eleitoral causado por essa fake news.
No momento, a atividade da milícia digital bolsonarista nas redes sociais tem quatro eixos principais de impulsionamentos: O primeiro é a defesa da política geral do governo; o segundo, é a difusão de conteúdos digitais de caráter conspiratório – a suposta articulação do STF e dos políticos no Congresso para depor o presidente, a ação internacional de ongs ambientais – e alarmistas, de denúncia dos efeitos das políticas de distanciamento social na pandemia; terceiro, a campanha em defesa de um pretenso tratamento precoce contra a Covid-19. E o quarto, em curso, visa a continuidade da campanha sistemática de desconstrução da imagem e do legado político do ex-presidente Lula. A tendência indica um incremento da campanha suja das milícias digitais contra Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT) nos próximos meses.
As milícias digitais bolsonaristas reforçam, cada vez mais, o emprego de novas técnicas e ferramentas para esconder e proteger as suas atividades criminosas. Desde a utilização mais comum e corrente de matilhas de bots comandados remotamente por um centro único, grupos de hackers para invasão de páginas e perfis pessoais, o deface [uma espécie de pichação virtual], a ação em ampla escala de phishing [pescaria ou coleta ilegal de dados dos alvos selecionados] e as aplicações a partir da Deep Web e derivados -, como a Dark Net acessada pelo navegador Tor. Um território explorado por diversos tipos de cibercriminosos: terroristas digitais, gangues de traficantes de drogas, páginas de pedofilia, páginas para a contratação de assassinos de aluguel, redes de tráfico de mulheres para escravidão sexual e de ações digitais de desestabilização de governos e empresas.
Portanto, é necessário organizar um enfrentamento político e tecnológico contra as milícias digitais e os cibercriminosos da extrema direita bolsonarista desde já. Além disso, evitar a improvisação no trabalho da esquerda, em especial do PT, nas redes sociais e no conjunto das mídias digitais, investindo mais recursos humanos e materiais nesta frente contemporânea de luta política, ideológica e cultural.
As últimas eleições presidenciais nos Estados Unidos demonstraram um intenso e áspero embate político no front das mídias e aplicativos digitais. Tudo indica que aqui não vai ser diferente. Lula e o PT vão vencer o lavajatismo, mas não existe um caminho suave até 2022. É preciso estar atento e forte!
*Ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT’ (2019), ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020) e de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil’ (2021) – todos pela Kotter Editorial. Escreve semanalmente em diversas mídias progressistas e de esquerda.