Eleições 2020: Entrevista com Prof. Francisco
Novo Gama, Goiás. Com 115 mil habitantes, a cidade fica no entorno do Distrito Federal. Munícipio emancipado há 25 anos, tem como pré-candidato a prefeito do PT o Professor Francisco, membro do DAP DF e entorno. O Professor Francisco entende que é preciso colocar no centro da disputa municipal as reivindicações locais ligada à questão nacional: “Vamos precisar mobilizar prefeitos e o povo para pressionar pela revogação da Lei de Responsabilidade Fiscal, do teto de gastos do Temer (EC 95) e de outros mecanismos que impedem que os municípios priorizem o serviço público ao povo. Tudo acaba passando por uma batalha em escala nacional”, diz o Prof. Francisco. Leia a entrevista completa concedida a Marcius Siddartha.
Entrevista com o Professor Francisco, pré-candidato do PT à prefeitura do Novo Gama-GO
1. O que te levou a apresentar o nome como pré-candidato a prefeito?
São muitos anos como professor no município, desde 1988, antes da emancipação em 1995, quando a cidade era parte de Luziânia. Fizemos muitas lutas até fundar o Sindicato dos Professorees (Sinpro) Novo Gama em 2007. Fizemos greves importantes nos diversos governos garantindo conquistas importantes como a da Jornada ampliada e o Plano de Carreira dos Professores. A cidade apesar de sua emancipação não conseguiu se desenvolver e nem atender aos anseios mais básicos de serviço público da população, muito carente de diversas necessidades e de ofertas de emprego. A pré-candidatura surge ao perceber que não temos alternativas efetivas para os trabalhadores nas candidaturas que se apresentam nas eleições. O Sinpro Novo Gama tem sido o maior foco de resistência na cidade e de oposição ao governo Sônia Chaves (PSDB), chegando a fazer a greve mais longa da cidade de 93 dias no ano passado. Não podemos nos omitir se precisamos de mudanças.
2. Quais as principais características do Novo Gama?
A primeira rua na entrada da cidade faz parte do DF. A proximidade do Novo Gama com Brasília faz com que a cidade seja uma cidade dormitório. A maioria da população do Novo Gama trabalha em Brasília, especialmente na camada mais proletarizada, sendo eles trabalhadores domésticos, de serviços de limpeza, vigilantes, rodoviários, terceirizados na administração pública. A cidade possui uma receita própria pequena, sendo bastante dependente dos recursos repassados pela União e pelo Governo de Goiás. Com a Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos públicos por 20 anos, os impactos destrutivos nos serviços públicos são sentidos pela população que mais precisa do Estado para sobreviver.
3. Como você relaciona as relações municipais ao cenário da política nacional e internacional?
A pandemia do coronavirus revelou que diversos governos pelo mundo deixaram de lado o atendimento público de saúde. Nos EUA, maioria dos que estão morrendo são negros e latinos que não tem acesso aos seguros privados de saúde. No Brasil, ainda temos o SUS, que faz uma diferença só por existir, mesmo com o desmonte e com os desvios de verba pública para hospitais e clínicas particulares que ele permite. O cenário de caos só se agrava quando percebemos que o presidente da República leva o país para o pior rumo com suas escolhas, priorizando usar reservas para dar subsídio aos banqueiros e tentando impedir e agora reduzir o auxílio emergencial, mesmo agora quando mais cresce a categoria de “empregados sem salário”, de acordo com o IBGE 11,5% (9,7 milhões!) da população empregada não recebeu o salário em maio. Uma questão central nestas eleições é a necessidade de lutar pelo fim do governo Bolsonaro, para que possamos resistir e sobreviver a essa ofensiva que só se agrava a cada dia. O povo não vai aguentar a essa política até 2022.
4 . Quais as dificuldades que o município está enfrentando durante a pandemia?
Como na maioria dos municípios, há subnotificação dos casos. Profissionais da saúde reclamam que nem eles estão tendo testagens, faltam equipamentos de proteção individual adequados. Apesar de terem transformado um posto no Lunabel para atendimento aos pacientes de Covid não temos nenhum respirador na cidade nem leitos de UTI. O comercio só ficou fechado por duas semanas, no início da pandemia. Os casos aumentam a cada dia e temos registro de servidores da prefeitura que vieram a óbito em detrimento do vírus. Não há um controle dos casos porque a grande maioria acaba sendo deslocada para hospital de Santa Maria (DF) e Gama (DF), o que acaba fazendo com que os registros fiquem bem abaixo da realidade. No dia 27 de junho eram 340 casos confirmados, 18 óbitos.
5. O que pensa em fazer como prefeito?
“É preciso se criar uma empresa pública de
transporte que seja integrada com o DF para melhorar a qualidade de vida dos moradores que acordam 4h da manhã para ir trabalhar e ficam o dia todo no DF, voltando cansados em ônibus lotados”
Costumo dizer que gosto de falar pouco e prefiro agir. Nesse sentido, coloco meu pé bem no chão. Sei que os recursos da prefeitura são limitados em todos os sentidos. Não dá pra prometer um monte de coisa que sabemos que não poderão ser resolvidos em 4 anos. Também não podemos imaginar a situação das contas públicas depois da pandemia. Sabemos que teremos muitos problemas e desafios a enfrentar e não faltará coragem de trabalhar para superá-los. O sistema de arrecadação do município é frágil. Existem grandes loteamentos que pagam imposto abaixo do valor. Se fosse implantada uma superintendência de fiscalização, com modernização dos processos poderíamos começar a mudar muita coisa. É preciso se criar uma empresa pública de transporte que seja integrada com o DF para melhorar a qualidade de vida dos moradores que acordam 4h da manhã para ir trabalhar e ficam o dia todo no DF, voltando cansados em ônibus lotados. Morador do Novo Gama acaba tendo uma vida de bicho. Gostaria muito de poder mudar essa situação.
Além do dever de casa que precisa ser feito, certamente teremos muito trabalho de articulação política com municípios da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno que reúne 33 municípios. Penso que seria necessário se discutir a criação de um Consórcio entre tais municípios para permitir maior força para negociar com governo do DF e de GO que só lembram da região em período eleitoral e para cobrar os impostos. Na hora de investir na região há sempre um descaso histórico com a região que acaba sendo “terra de ninguém”.
Vamos precisar mobilizar prefeitos e o povo para pressionar pela revogação da Lei de Responsabilidade Fiscal, do teto de gastos do Temer (EC 95) e de outros mecanismos que impedem que os municípios priorizem o serviço público ao povo. Tudo acaba passando por uma batalha em escala nacional para mudar por completo essa concepção de desvalorização dos municípios, os entes mais fragilizados da Federação.