A discussão no PT do Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil
O PT vem discutindo no seu Diretório Nacional (DN) um Plano chamado de “Reconstrução e Transformação do Brasil”, cujo projeto foi encomendado à Fundação Perseu Abramo.
Do lado de fora, há uma situação muito grave com metade da força de trabalho expulsa do mercado de trabalho e uma crise sanitária que continua, enquanto o governo Bolsonaro, com a cumplicidade do Congresso e do Judiciário, multiplica ataques contra os direitos sociais.
Nesta situação, o PT, como principal força da oposição, deveria apresentar um Plano de Emergência, com propostas praticas imediatas e alternativas que fossem um fator de mobilização social na luta pelo fim do governo Bolsonaro, antes e durante o processo eleitoral municipal que começa.
Um Plano de Emergência do PT deveria destacar pelo menos três eixos:
- frente a pandemia, para proteger a vida do povo, organizar a testagem em massa: cabe ao governo federal coordenar os demais níveis de governo; os governadores pelo PT deveriam liderar a cobrança e sua aplicação;
- frente ao desemprego, garantir a estabilidade no emprego e os salários, além do auxílio de emergência de R$ 600 enquanto durar a pandemia, com medidas de retomada da economia para recuperar os postos de trabalho;
- para a volta às aulas, adotar um conjunto de medidas que criem condições seguras para a comunidade escolar, discutidas com as organizações de professores e de juventude, com base no protocolo elaborado pela Fiocruz.
O financiamento destas medidas sairia das despesas extraordinárias autorizadas pelo Decreto Legislativo do Congresso desde março.
No entanto, o Plano que o PT discute não é isso. Ele tem um capítulo “Emergencial”, é verdade, mas tem também dezenas de capítulos tão detalhados como um plano “de Governo”. É o que predomina nas mais de 100 páginas. Mas seria um plano de governo para quem, no caso? Nem o PT está no governo e nem estamos em processo de eleição presidencial, então, não é uma plataforma eleitoral tampouco.
Fica no ar a questão da utilização deste Plano, enquanto a situação social do país não dá mostras de melhorar, ao contrário.
Debate sobre Constituinte
No debate no DN, entre várias questões, cabe destacar a polêmica sobre a integração ou não da Constituinte no Plano. Afinal, se é um plano de Reconstrução e ainda mais de Transformação, como fazer se não através de uma Constituinte Soberana? Não será com Bolsonaro nem neste Congresso Nacional que vem destruindo o país.
Por isso, foi importante a adoção, após alguma resistência, da bandeira da Constituinte. Ela foi apresentada pelos membros do Diálogo e Ação Petista (DAP) no DN, tal como foi formulada no 7º Congresso do PT, em novembro. Foi preciso votar, ao final do debate, houve 5 abstenções, basicamente do grupo Avante da deputada Maria do Rosário. Outros companheiros retiraram suas emendas a respeito, em favor de um texto de acordo, encabeçada pelo trecho do 7º Congresso Nacional do PT abaixo:
Constituinte Soberana
“Para as reformas necessárias ao desenvolvimento soberano – como a reforma agrária, da mídia, jurídica, tributária, e, inclusive, militar – é necessária uma profunda reforma política do Estado que mude radicalmente as atuais instituições. O PT é imprescindível para derrotar o golpismo e convocar uma Assembleia Constituinte Soberana, o meio democrático de promover aquelas reformas, com a legitimidade de um novo governo e Lula inocente.”
Outras discussões
Além desta, ocorreram longas discussões sobre outros temas. A honestidade recomenda questionar se a maioria dos membros da instância tinham lido o projeto e as centenas de emendas, ou se a boa parte seguia as orientações dos líderes dos agrupamentos internos.
Tomou um longo tempo um debate dito de “concepção” sobre o socialismo, que terminou com 11 votos de abstenção onde, por suposto, todos são socialistas… Na discussão se falou de muita coisa, mas ninguém propôs a expropriação da grande propriedade privada dos meios de produção. De que socialismo, então, se está falando?
Por outro lado, uma emenda de Estatização do Sistema Financeiro, apresentada por Valter Pomar e apoiada pelo DAP e outros, foi rejeitada pela maioria, por 46 votos contra (basicamente, as correntes CNB e MPT), e 27 votos a favor dessa Estatização, além de 1 abstenção (Raul Pont).
Na verdade, a questão do programa revolucionário nunca foi resolvida no PT. Ainda nos anos 80, o PT adotou a bandeira da luta pelo socialismo, apenas indicada no seu Manifesto de Fundação, ainda sob a Ditadura Militar.
O PT sofre da falta de um programa revolucionário mais desenvolvido. Um programa que articule as medidas imediatas – como as do Plano de Emergência sugerido acima -, com outras medidas de ruptura com o imperialismo, como a estatização do sistema financeiro, reestatizações estratégicas, controle do câmbio, estatização do comércio exterior etc. – de modo a abrir caminho para o socialismo, com o planejamento da economia sob controle social.
Nesse processo, uma Constituinte Soberana, com um novo governo encabeçado pelo PT, devem um ponto de passagem – uma ruptura democrática – que só a força do povo mobilizado pode impor. Daí a importância, para os socialistas, de manter a incorporação da bandeira da Constituinte no Plano em discussão no Diretório Nacional.
Comparado à Plataforma de Governo Lula-Haddad das eleições presidenciais de 2018, este Plano não tem muitos avanços, mas tem alguns recuos como a naturalização da proposta das PPPs (Parcerias Público-Privadas) e de concessões privadas “em certos casos”.
Para alguns membros do DN que falaram, o Plano é um apoio para a campanha municipal que começa, já para outros uma reflexão de futuro para as eleições de 2022. Ao final do debate, foi adotado um Preâmbulo (o Plano ainda não foi publicado) reafirmando o documento como parte da luta pelo fim do governo/fora Bolsonaro. Em nenhum caso, ele deve ser um fator de dispersão da lutas concretas contra o governo genocida.
Markus Sokol
Muito boa escrita!!!