“Por isso procurei o DAP para contar esta história e buscar apoio”
Costureiras do estado do Rio de Janeiro sofrem assédio moral e repressão no trabalho
Entrevistamos uma trabalhadora desta empresa de confecção que presta serviço para um grande magazine, e que reagem aos desmandos do patrão. Omitimos os dados dos envolvidos para preservar as trabalhadoras. O DAP prestará apoio a essa luta.
Há quanto tempo a companheira trabalha nessa empresa, qual é seu salário? Tem benefícios? Os direitos das trabalhadoras são respeitados?
Eu trabalho há um ano e oito meses. O salário é R$1.790,00 bruto, tem os descontos legais, a passagem do ônibus. Recebemos um vale alimentação de R$120,00, só que, caso haja falta, mesmo justificada, não nos pagam, a menos que a encarregada decida que você pode receber, mas em geral a regra é aplicada. Faltou, perde o auxílio. Por exemplo, uma mãe que vai levar o filho ao médico, perde.
Qual a jornada de trabalho? Os intervalos de descanso são respeitados? As horas extras são pagas?
Trabalhamos das 8 às 18 e na 6a feira das 8 às 16, com 15 minutos de lanche e 1 h de almoço. Se houver algum erro no trabalho, a profissional ou as demais, são obrigadas a corrigir no horário de almoço. A encarregada diz para quem errou: “você tem amigas? Agora vai ver se tem mesmo. ” A gente se ajuda para resolver o problema da colega, durante o almoço. As peças com erro, têm de ser desmanchadas e refeitas, todas ajudam, para a colega não perder todo seu horário de almoço. A gerente é conivente, vê toda a equipe trabalhando no horário de almoço. Todo mundo tem medo, pois o tempo todo é feita a ameaça ‘a produção está na sua mão’”. A maior parte das horas extras ficam no banco de horas, mas algumas são pagas.
A produtividade, como isso é decidido e controlado?
Nosso trabalho é controlado pela produção de peças, a encarregada define o número, e exige de cada uma o cumprimento. Todo mundo tem medo, pois o tempo todo é feita a ameaça “a produção está na sua mão”, pressionando a profissional que fica com medo de não cumprir.
Há ocorrência de acidentes de trabalho? Tem CIPA devidamente eleita, conforme a lei?
Acontecem alguns acidentes, vai no Departamento de Pessoal, na maior parte do tempo colocam um pano no dedo, não fala para a encarregada. Tem CIPA, a encarregada e pessoas próximas a ela são membros, coniventes. Não há educação, orientação de prevenção de acidentes. As máquinas têm acessórios de proteção, que a gente deixa levantado. A gente trabalha de sandália ou chinelo, só quando vem o fiscal da contratante do serviço que mandam a gente calçar o tênis e abaixar a proteção. Para aparentar conformidade. A caixa de reclamações/sugestões também só aparece nesse momento. Mesmo assim quem vai ter coragem de colocar uma sugestão/reclamação com tanta pressão?
Quantas operárias trabalham no seu setor?
Em torno de 120 trabalhadoras entre costureiras e área de corte, não tenho ideia do número total, porque a gente não fala entre si, existe uma proibição de conversa entre nós. A maioria são mulheres e a maioria trabalha nisso há bastante tempo.
Quais os problemas que as levaram a tomar uma atitude? Qual é o clima no ambiente de trabalho?
A gente acha que aquilo que o patrão faz é ilegal, já temos a noção do que é permitido. Esse sentimento aqui é diário, uma pressão que todas sentimos, mal podemos ir ao banheiro. Além disso, há agressão verbal, a encarregada joga as peças de roupa no chão, te humilha, se erramos questiona se somos realmente costureiras. Eu percebi que isso estava num ponto extremo, e no banheiro – onde a encarregada diz não haver câmeras – eu comecei a conversar com as meninas e fomos trocando telefone, pois o terror é tão grande que a gente fica sem se falar até entrar no ônibus para ir para a casa.
Esses problemas só afetam o seu setor?
Sim, só meu setor, promovido pela encarregada. Com a troca de telefones começamos a conversar, eu vi que era generalizado e as meninas também entenderam que aquilo era assédio moral. Além de outro tipo de pressão, como o que aconteceu na campanha eleitoral de 2022, as encarregadas andavam com adesivo do 22 (PL), tendo havido reunião com candidatos deles, no horário de trabalho também.
Procuraram o sindicato de sua região? Que tipo de apoio receberam?
Não fui direto ao sindicato da região, porque numa outra época, em outro emprego fui pedir ajuda pois tínhamos de lavar o banheiro na sexta-feira. A resposta da dirigente foi que com tanto desemprego nossa mão não iria quebrar se limpássemos o banheiro. Ali entendi que não poderia contar nunca com o sindicato.
E o que resolveram fazer?
É muito difícil, porque tivemos de fazer tudo escondido, por tudo que já falei. Procuramos apoio jurídico e entramos com ações individuais. Quando chegou a primeira citação judicial da empresa, aí eles tiveram conhecimento de que estávamos em movimento.
O que esperam com essa luta?
Sabemos que podemos ser despedidas por conta disso, mas por enquanto o processo está correndo. O patrão colocou mais câmeras no ambiente de trabalho. A encarregada não está tão agressiva como era, mas ainda pressiona. Tentamos ajudar uma à outra, estamos unidas. Estamos na fase de aguardar a audiência, mas estamos decididas e firmes. Sabemos o que pode vir pela frente, por isso procurei o DAP para contar essa história e buscar apoio diante dessa situação tão grave. Não podemos suportar tanta humilhação sozinhas, sabemos que estamos certas.